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quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

A Elegância do Ouriço, de Muriel Barbery

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"Todas as famílias felizes se parecem, mas as famílias infelizes o são cada uma a seu jeito” (Ana Karenina, Leon Tolstoi)

Paris, Rue de Grenelle, número 7. Um jardim rodeado por oito apartamentos habitados pela mais alta burguesia francesa. Como nada mais corriqueiro, um cubículo no andar térreo destinado à concierge que executa as tarefas mais triviais – tirar o lixo, controlar a entrada e saída de pessoas e desconfiar de todas as possíveis fofocas que percorrem o prédio. Aparentemente, correspondendo ao clássico estereótipo de concierge parisiense, Renné, ou Sra. Michel – como todos a conhecem –, é viúva, baixinha, feia, gordinha e acorda certas manhãs com hálito de mamute. Seu gato Leon, tipicamente gordo, ajuda a manter a aparência de zeladora, assim como o aparelho de televisão recorrentemente ligado e uma existência discreta e insignificante. Dessa forma, Renné segue sua vida, mantendo a ilusão de se enquadrar nas crenças que definem o papel de cada pessoa dentro do jogo das hierarquias sociais.
No entanto, Renné possui segredos que, executados com muita discrição, não saltam aos olhos de nenhum dos ricos moradores. Incapazes de acreditar na possibilidade de uma zeladora que lê Marx, Tolstoi e, como ela mesma diz, um certo Marcel, assiste a filmes antigos e é uma conhecedora excepcional de música clássica, os habitantes do número 7 ajudam a consolidar o estereótipo a respeito das diversas classes sociais. Renné, portanto, mascara sua verdadeira identidade intelectual falando algumas palavras erradas, comprando produtos baratos e passando despercebida, quando possível, pelos corredores.
Apesar disso, Paloma, uma jovem de 12 anos, assim como um novo morador do prédio, Kakuro Ozu, percebem as excentricidades da concierge. A menina, que reveza a narrativa em primeira pessoa com a própria Renné, é muito inteligente para sua idade e escreve dois tipos de diários ao decorrer das páginas: “Pensamentos profundos” e “Diário do movimento do mundo”. Com o objetivo final de se suicidar ao completar 13 anos e colocar fogo no apartamento dos pais, acompanhamos Paloma em uma série de reflexões acerca do sentido da vida, do significado da morte e da beleza e da desilusão presente nos acontecimentos mundanos. Assim como Renné, Paloma nos carrega para seu mundo individual e nos apresenta seu ponto de vista, aproximando-se a cada capítulo dos pensamentos da concierge.
Paloma, apesar de jovem, possui pensamentos tão profundos quanto os da velha de 54 anos; ela não consegue compreender e nem se reconhecer no universo no qual está inserida. Sua mãe adora citar Freud e contar detalhadamente suas consultas ao psiquiatra que lhe receitou antidepressivos dos quais está completamente dependente. Seu pai procura passar uma ideia de homem seríssimo, Ministro da República, mas que merece tempo livre aos finais de semana para assistir a uma partida de rúgbi e tomar uma cerveja. E sua irmã, que cursa filosofia, é provocativa e sabe menos sobre as questões da vida do que Paloma.
Assim, o romance toma fôlego com a chegada de Kakuro Ozu ao prédio, um idoso japonês que, apesar de podre de rico, destoa do convencional burguês intocável. Pelo contrário, é ele quem descobre a verdadeira Renné da literatura, do cinema e da arte e mostra ser possível uma relação de amizade ou até mesmo de amor entre as diferentes classes sociais. Assim, Ozu e Paloma, a quem encanta a cultura japonesa, juntos conhecem a verdadeira Renné e, pela primeira vez em sua vida, ela se vê completa. Ao citar Tolstoi, ao reconhecer uma natureza morta de Pieter Claezs pendurada na parede e ao admitir conhecer o Confutatis do Réquiem de Mozart que toca toda vez que dá a descarga no banheiro de Ozu, Renné se denuncia, inviabilizando seu retorno à típica imagem de concierge que representara com tanta perfeição durante anos.
Dessa forma, apesar de trair-se, Renné encontra pessoas com quem pode compartilhar uma existência simples, mas regada a chocolate amargo, chá e discussões literárias e filosóficas sobre a “grande ilusão universal de que a vida tem um sentido que pode ser facilmente decifrado”.

A Elegância do Ouriço dispõe uma série de personagens caricaturais que, descritos sem parcimônia nem polidez, criam imagens exatas de pessoas reais. As personagens possuem características detalhadas, minuciosas e particulares, as quais lhes concedem traços humanizados. Auxiliada pela narrativa em primeira pessoa, é a construção dessas personagens que torna o romance extremamente cativante e aproxima o leitor do universo literário, estimulando a empatia e a reflexão junto aos problemas propostos pelas narradoras. O humor implícito por meio de metáforas e ironias percorrem o livro e criam uma atmosfera mais leve, porém repleta de críticas sociais a partir da desconstrução dos estereótipos. É compreensível, portanto, que esse livro tenha ganhado inúmeros prêmios literários, além de ter se tornado um dos atuais best-sellers franceses.

Unknown / Perfil

Associação civil sem fins lucrativos formada por alunos do Instituto de Estudos da Linguagem, a Odisseia foi idealizada com o objetivo de preparar seus integrantes para o mercado de trabalho. Seus serviços oferecidos incluem coaching, revisão e análise crítica/parecer crítico; tópicos que estão, de certa forma, inseridos na criação dos cursos de Estudos Literários, Letras e Linguística. Além de oferecer esses serviços, a empresa busca estabelecer um vínculo maior entre os estudantes do Instituto de Estudos de Linguagem da UNICAMP (IEL) e o mercado editorial.

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